De Terradillo de Templários a Reliegos - 45 km
A Santiago: 335 km
Sexta-feira, 28 de Setembro de 2001
Saí do albergue de Terradillo de Templários antes das 8h. Ainda estava escuro. Chovia com intermitência, provocando os bota-tira capa. Em Sahagun, cidade interessante e de passado
poderoso, troquei TCs, conheci o monastério onde fica o albergue, que dizem ser excelente, fiz lanche, tratado otimamente pelo garçom do Mesón, que adivinhou minha condição de brasileiro. Ajudou-me até a pôr a mochila e a capa,
pois ainda chovia à hora em que saía para retomar o caminho. Passei pela famosa ponte, e pelo cenário onde travou-se histórica batalha entre muçulmanos e as tropas de Carlos Magno, quando, segundo a lenda, as lanças dos guerreiros
cristãos floresciam ao ser cravadas no chão, sinal da proteção divina.
Na altura de Calzada del Coto, optei por pegar a calçada romana e não o "andadero" dos peregrinos. Aparentemente, era o único peregrino a fazer essa
escolha, os demais devem ter seguido pelo andadeiro. No trajeto, resolvi não dormir em Burgo Ranero e caminhar mais 13 Km até Reliegos. Foi uma caminhada interminável pela "meseta" leonesa. Não avistava nenhum aglomerado urbano
naquele horizonte de planura imensa, mas avancei sempre, até porque não tinha outra saída. A sinalização do caminho era boa, caminho semeado de "mojones" com o símbolo do Caminho de Santiago, mas com um problema: conduzia a
Mansilla de las Mulas e não a Reliegos, aquela distando cerca de 7 Km adiante. Vi um vilarejo ao largo do caminho, mas como a sinalização não ia para lá, o deixei de lado e continuei caminhando quase desfalecendo de cansaço.
O caminho era de pedregulho, o vento era frontal e por vezes chuviscava. Buscava energia de espírito para caminhar até aquela cidade, que aparecia no horizonte, ao pé da serra leonesa, que eu imaginava fosse Reliegos. Ao longe,
na estrada no meio de lavoura de trigo já colhido, aproximava-se uma senhora, que num primeiro momento achei fisicamente parecida com minha mãe. Quando nos encontramos, perguntei se aquela cidade lá no fundo era Reliegos. O
alívio foi enorme quando informou que Reliegos era o vilarejo que aparecia ao lado do caminho, e os aglomerados urbanos no horizonte eram Mansilla de las Mulas e alguns projetos habitacionais vizinhos.
Mercedes era o
nome da senhora. Quando soube que era brasileiro tomou-se de cuidados por mim, prontificou-se a levar-me, e levou-se, até o refúgio de Reliegos, falou que seu falecido marido foi funcionário da Volkswagen, em São Paulo, nos
anos cinqüenta, que gostava e lhe falava muito do Brasil. Foi um anjo, dona Mercedes, moradora de Reliegos, que me pediu, ao despedirmo-nos, uma prece por ela a Santiago.
No refúgio, conversando com uns franceses, que
também estavam prosseguindo sem querer até Mansilla de las Mulas, dei-me conta de que havia caminhado 45 Km desde Terradillo de Templários. Foi a etapa mais longa, até agora. Dificilmente farei outra igual.
Jantei mal
num "Mesón" perto do bom refúgio local, com meia garrafa de vinho ordinário, e fui dormir consolado pelo pensamento de que a etapa do dia seguinte seria curta, permitindo chegar não muito cansado a Leon.