De Lourdes a Santiago de Compostela

por  OSWALDO BUZZO

3ª Jornada – Cansaço


Em Lubher St Crhistie encontrei, finalmente, a primeira flecha do Caminho, vez que naquela cidade passa a Rota de Arles. Chegara até aquela localidade caminhando sempre pelo asfalto, num ramerrão tépido, insosso e desenxabido, mas finalmente ali, meus passos foram direcionados para a terra. O que muito me alegrou.

Trilhei, então, em meio a colinas ondulantes, adornadas por flores silvestres, pequenos bosques de pinheiros, lagos serenos e árvores florindo em cores incontáveis, vacas pastando em campos verdejantes, enormes pessegueiros carregados de frutos. E, apesar de tanta beleza ao meu redor, oprimia-me uma sensação de fatalidade diante de um perigo iminente, que me acompanhava desde a saída de Lourdes. A sensação era de que, pairava no ar aquela paz inquietante dos períodos de calmaria os q uais ocorrem entre duas catástrofes.

Entretanto, a partir da cidade de Escot, devido à torrencial chuva da véspera, as trilhas se tornaram ásperas, penosas, impraticáveis até para alguém bem preparado fisicamente. Quase sempre à beira do caudaloso rio Aspe, em meio a bosques fechados, conduziram-me a subidas íngremes e ladeiras extremamente escorregadias e, em vários trechos, ladeando a borda de grandes precipícios. Em alguns locais, senti aquele arrepio moderado de pânico que vem da consciência de que eu poderia levar um tombo no abismo ou cair no curso d’água, e desaparecer sem deixar o menor vestígio.

Diante disso, optei por retornar ao asfalto, e assim segui novamente à beira da rodovia. Um pesadelo, pois não existia acostamento, e o movimento ali era intenso, pesadíssimo, onde trafegavam enormes caminhões e carretas de um lado e outro. Os veículos passavam em grande velocidade, e os ocupantes de alguns deles buzinavam como forma de incentivo, a maioria, todavia, me observava com uma bovina indiferença.

Felizmente, às 15 h avistei Sarrance, minha meta para aquele dia, e ainda assim, sentia uma repentina e inesperada apreensão. Que se intensificou ao encontrar o único hotel da cidade fechado e em obras. Decididamente, ponderei, a ordem das coisas já não fluía como no início da jornada, em que encontrei alojamentos em profusão.

Decepcionado, sentei na pracinha local e comi um sanduíche frio sem reconhecer o sabor. Todos os meus sentidos estavam parcialmente embotados, os pensamentos lentos e confusos pelo cansaço e frio que sentia. Ja era primavera, no entanto, o céu permanecia de um cinza sombrio, e a temperatura quase ao ponto de congelamento, não me ajudava a coordenar as idéias.

Depois, sem alternativa para pernoite, prossegui até Bedous, uma aventura inesperada que, todavia, notabilizou-se posteriormente, por recordá-la como uma depauperante caminhada em meio a locais de esplendorosa beleza.

E tem mais:

E tem muito mais ainda...